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O PALACETE DO BARÃO DAS DUAS BARRAS



Palacete do Barão das Duas Barras. Nos dias de hoje, a existência de prédios em seu entorno impede a sua visualização de vários pontos da cidade. É considerado um dos mais importantes patrimônios históricos de Nova Friburgo, tombado em 1988, pelo INEPAC. Esse palacete foi construído por Elias Antônio de Moraes, o segundo Barão das Duas Barras, da importante família Moraes, uma das mais ricas entre a elite rural fluminense. Fizeram fortuna no século 19, na região de Cantagalo, com o plantio do café e atividades financeiras. A história da família Moraes na província fluminense tem início com João Antônio de Moraes. Nascido em 1810, era o décimo de doze filhos de Antônio de Moraes Coutinho e de Maria Felizarda de Sant’Ana, originários da província de Minas Gerais. João Antônio de Moraes casou-se com Basília Rosa da Silva, neta de uma ex-escrava e nascida Cantagalo. No entanto, o primeiro casamento de Basília não foi com João Antônio, e sim com um irmão deste, Antônio Rodrigues de Moraes. Porém, Antônio morreu assassinado e Basília, na ocasião com 30 anos, vendo-se sozinha para cuidar de suas terras e de cinco filhos, casa-se com o cunhado João Antônio de Moraes, com 23 anos, que se encarrega da administração dos negócios da família. Além dos cinco sobrinhos que tinha sob a sua guarda, João Antônio teve com Basília quatro filhos. Além da Fazenda Santa Maria do Rio Grande, onde residiam, o inventário de seu irmão incluía a Fazenda Macabu, a propriedade de 50 escravos e de bens móveis. Porém, João Antônio herdara também uma dívida do irmão com Antônio Clemente Pinto, o primeiro Barão de Nova Friburgo. João Antônio de Moraes não só saldou a dívida com o barão, evitando a perda das duas fazendas, como igualmente foi adquirindo muitas outras propriedades ao longo dos anos, colocando a família entre as mais ricas na província fluminense. Desde 1835, quando assumiu a direção dos negócios da família, até 1872, quando fez em vida a partilha dos bens do casal, João Antônio acumulou um grande patrimônio em terras, escravos, pés de café e dívidas ativas. Além das fazendas Santa Maria do Rio Grande e Macabu, ao longo dos anos adquiriu outras vinte, sendo elas Barra, Bonança, Boa Esperança, Canteiro, Coqueiro, Córrego Alto, Engenho da Serra, Engenho Velho, Freijão, Glória, Grama, Monte Café, Neves, Olaria, Paraíso, Ribeirão Dourado, Rio São João (em Minas Gerais), Sant’Alda, São Lourenço e Sobrado. Aproximadamente mil escravos trabalhavam em suas 22 fazendas. O plantio do café permitiu a expansão econômica de João Antônio de Moraes e lhe rendeu, em 1867, o título de primeiro Barão das Duas Barras. Possivelmente, o número extraordinário de fazendas que acumulou é resultado de hipotecas de sua atividade usurária como emprestador de dinheiro a juros aos fazendeiros da região. A diversificação dos negócios coloca João Antônio de Moraes entre os denominados fazendeiros-capitalistas, que perceberam o fim próximo da escravidão e se prepararam para enfrentar o problema que a falta de mão-de-obra traria para suas lavouras. Acreditando poder manter os ex-escravos em suas fazendas após a abolição, como trabalhadores rurais, libertou antecipadamente seus cativos e lhes doou pés de café e lotes de terras na sua Fazenda Santa Maria do Rio Grande. No entanto, o estilo de vida do primeiro Barão das Duas Barras era bastante simples e rústico. O enriquecimento não trouxe uma mudança substancial nos hábitos de sua família. Tinha costumes patriarcais mineiros. A sua mesa era mineira, frugal e abundante. Nela apareciam a canjica, as pipocas, a couve mineira, o caldo de unto e a rapadura. Preferia a calça e a camisa de brim mineiro aos finos tecidos importados. Manteve-se um homem rural, não construiu suntuosas residências nas vilas, como outros nobres, e não ocupou cargos públicos. Nunca mandou fazer um brasão da família e não chegou a ter louças e cristais com seu monograma. No máximo, teve um aparelho de chá de prata gravado com suas iniciais e fez-se retratar em uma pintura, assim como a baronesa. João Antônio faleceu em 1883, e em seu testamento pediu para ser sepultado no cemitério da Fazenda Santa Maria do Rio Grande e que o seu corpo fosse transportado pelos escravos mais idosos. Deixou aos herdeiros terras, escravos, pés de café, dívidas ativas e dinheiro. As estratégias matrimoniais com a construção de alianças através do casamento foram utilizadas pelos Moraes para aumentar o patrimônio da família. A endogamia, ou seja, casamentos entre familiares próximos, era muito comum entre a elite latifundiária da época. Essa tendência manifestou-se claramente nos arranjos matrimoniais que João Antônio estabeleceu para seus filhos e enteados. Para a maioria deles escolheu primos-irmãos, com o objetivo de fortalecer os laços de parentesco e de garantir o seu controle sobre os negócios da família. Esse padrão de casamentos interprimos repetiu-se com freqüência na terceira geração, entre os netos e sobrinhos-netos do barão com o objetivo de fortalecer a família. Essa prática garantia a permanência da fortuna entre os Moraes e sustentava a coesão do grupo familiar.


Não dá para citar a trajetória de todos os Moraes, mas podemos mencionar os que mais se destacaram. José Antônio de Moraes, segundo filho de Basília e de Antônio Rodrigues de Moraes, recebeu o título de Barão de Imbé, em 1884, e cinco anos depois, de visconde. A divisão geopolítica da província do Rio de Janeiro iria alterar bastante com a proclamação da República. Neste arranjo político estiveram envolvidos membros da família Moraes. Nesse contexto foi criado o município de São Francisco de Paula, que recebeu posteriormente o nome atual de Trajano de Moraes, filho mais velho de José Antônio de Moraes e Leopoldina das Neves, os Viscondes de Imbé. O notório político de Nova Friburgo, Galdino do Valle Filho era bisneto dos Barões das Duas Barras. Era filho de Francisca de Moraes Martins e de Galdino do Valle. Nascido em 1879, na Fazenda Olaria, de propriedade de sua avó Felizarda de Moraes, Galdino do Valle Filho mudou-se para Nova Friburgo. Formado em medicina, se elegeu deputado federal nos anos de 1924, 1927, 1930 e 1954. Após o fim do mandato como parlamentar, em 1959, afastou-se definitivamente da política. Elias Antônio de Moraes, o quarto filho de João Antônio, ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e em 1865, diplomou-se. Elias Moraes foi um caso raro de casamento por opção pessoal. Apaixonou-se pela jovem carioca Georgeanna e se casaram com as bênçãos da família. Recebeu como dote a Fazenda do Ribeirão Dourado onde nasceram os cinco filhos do casal. A expectativa de seu pai era de que Elias Moraes fosse cafeicultor e exercesse a medicina apenas no atendimento de doentes pobres ou escravos. No entanto, Elias nunca assumiu totalmente a atividade econômica do café como desejava o seu pai. Passou a importar touros e vacas da raça indiana guzerá e criar o gado nelore na Fazenda do Ribeirão Dourado, seguindo o exemplo da família Lemgruber, que introduziu esse gado no Brasil. No ano de 1889, no apagar das luzes do governo monárquico, Elias Antônio de Moraes recebeu o título de 2º Barão das Duas Barras. Contudo, a carioca e urbana Georgeanna não se conformou com o isolamento do latifúndio em Cantagalo. O segundo Barão e a Baronesa das Duas Barras buscavam um estilo de vida urbano e bons colégios para os filhos e, na ocasião, era o que Nova Friburgo tinha de melhor. Adquiriram a chácara Boa Sorte, em Nova Friburgo, próxima a estrada Cantagalo, atual Rua General Osório. A construção do palacete ocorreu entre os anos de 1886 e 1896, sendo uma cópia em menor escala do palácio do Primeiro Barão de Nova Friburgo, atual Museu da República, no Rio de Janeiro. Como os Moraes cooptaram colonos em suas fazendas para substituir a mão-de-obra escrava, os imigrantes italianos auxiliaram na construção e no acabamento do palacete. Luiz Spinelli, que chegou ao Rio de Janeiro em 1889, depois de trabalhar algum tempo na fazenda do segundo Barão das Duas Barras é transferido para Nova Friburgo para trabalhar na edificação do palacete. Há fortes indícios de que o artista italiano Elviro Martignoni tenha pintado afrescos nesse palacete. Esse talentoso pintor contribuiu com o seu trabalho artístico na catedral São João Batista e na chácara do chalet dos barões de Nova Friburgo. Os seus afrescos podem estar escondidos sob camadas de pintura. Georgeanna organizava muitos saraus e soirées no elegante palacete e a vida social do casal era sempre mencionada no jornal O Friburguense. Muitos membros da família Moraes também se sentiram atraídos pela vida urbana e construíram confortáveis residências no centro de Nova Friburgo. O segundo Barão das Duas Barras faleceu em 1927, aos 87 anos de idade. Com o passar dos anos, o palacete passou da família Moraes para a propriedade da Prefeitura Municipal de Nova Friburgo. No ano de 1960, o Prefeito Municipal Amâncio Azevedo convenceu o governador Roberto da Silveira a trocar Petrópolis por Nova Friburgo em suas férias de verão. O palacete passou a ser residência oficial do governador do Estado do Rio de Janeiro. No entanto, em um acidente de helicóptero em Petrópolis, o governador Roberto da Silveira veio a falecer em fevereiro de 1961, em consequência da gravidade das queimaduras. Não sendo mais a residência de verão do governador, a partir do ano de 1971, o palacete passou a abrigar o curso superior de Odontologia, conhecida como Faculdade de Odontologia de Nova Friburgo, tendo como mantenedora a Fundação Educacional e Cultural de Nova Friburgo. Dois anos depois foi criada a Autarquia Municipal de Ensino Superior que mantinha a faculdade. Chegou a ser considerado o melhor curso superior de odontologia do país, sendo um dos mais procurados entre os estudantes. Um acordo entre a Prefeitura de Nova Friburgo e a UFF extinguiu a autarquia e o palacete passou a ser ocupado pela universidade. O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Unidades Federais, o REUNI, criou o Polo Universitário de Nova Friburgo, oferecendo cursos de graduação em odontologia, biomedicina e fonoaudiologia, através do Instituto de Saúde de Nova Friburgo. No ano de 2019, ocorreu a efetiva transferência do palacete para a Universidade Federal Fluminense, perdendo o município um dos seus mais estimados patrimônios históricos. A história da família Moraes foi extraída do livro “Histórias de Família, Casamentos, Alianças e Fortunas”, de Marieta de Moraes Ferreira.




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