Nova Friburgo era uma pacata cidade veranista quando empresários alemães aqui chegaram em 1911. O termo veranista não é ao acaso. Os turistas passavam todo o verão na cidade serrana, muito diferente dos atuais que ficam, em média, uma semana. Antecedentes históricos ligavam Nova Friburgo ao povo germano. Em 1824, um grupo de colonos de diversos Estados alemães se instalou na outrora vila do Morro Queimado para ocupar as datas de terras abandonadas pelos colonos suíços. Já em 1911, Peter Julius Ferdinand Arp(1858-1945) dá início a instalação de indústrias no ramo têxtil em Nova Friburgo, incentivando a vinda de Maximilian Wilhelm Bogislav Falck e de Carl Ernst Otto Siems. São proprietários, respectivamente, das indústrias Rendas Arp, Ypú e Filó. Desde que implantadas essas indústrias, inúmeros técnicos alemães são cooptados para trabalhar nas fábricas e começam a fixar domicílio em Nova Friburgo. O principal articulador dos contatos dos grupos Arp e Ypu com os trabalhadores na Alemanha era Max Cleff. Engomadores, tecelões, mecânicos, mestres de estamparia, todos trabalhadores qualificados emigram para o Brasil. Posteriormente, vêm suas famílias. Um episódio marcante na história nacional iria fornecer trabalhadores especializados para as recém instaladas indústrias em Nova Friburgo. Durante a Primeira Guerra Mundial(1914-1918) quarenta e cinco navios alemães da Marinha Mercante alemã foram apreendidos pelo governo brasileiro. Uma das cidades a que destinou esses marinheiros foi Nova Friburgo e escolheu-se o Sanatório Naval para a detenção dos prisioneiros. De acordo com Fischer em “Uma História em Quatro Tempos” foram, aproximadamente, 227 alemães da Marinha Mercante detidos nessa instituição. Um desses prisioneiros era Richard Hugo Otto Ihns(1889-1960), que por sua capacidade técnica foi cooptado para trabalhar na Rendas Arp, tornando-se um dos mais importantes executivos dessa empresa. Com tantos alemães em Nova Friburgo, já era tempo de se organizarem. Como os imigrantes portugueses, italianos e árabes formaram sua associação, uma prática comum entre os imigrantes para auxílio mútuo e manutenção de suas tradições culturais. Em 1916, um pequeno número de mestres das fábricas fundou o Clube Alemão que se ocupava, entre outras atividades, com a propaganda de Nova Friburgo como cidade de veraneio. Com a entrada do Brasil na Primeira Guerra Mundial o clube foi forçado a ser extinto.
As reuniões sociais passaram a se realizar em uma sala nos fundos da Confeitaria Balga. Uma escola para os filhos dos imigrantes alemães funcionava na igreja luterana que era na ocasião situada na Praça Paissandu. Já na década de vinte, do século 20, era significativo o número de alemães que tralhavam nas indústrias têxteis em Nova Friburgo. Muitos deles haviam trazido a suas famílias. Em razão disso, em 18 de junho de 1921, na Confeitaria Balga, surge oficialmente a Deutscher Schul und Kirchenverein, a Sociedade Alemã de Escola e Culto. Objetivava ser um centro difusor da cultura teutônica, ter função religiosa, assistencial, educacional, com o ensino da língua alemã aos filhos dos imigrantes, cultural, para manter suas tradições e finalmente, um centro recreativo, social e esportivo. Inicialmente essa sociedade se instalou no templo luterano. Permaneceu nesse local até o ano de 1924 quando mudou-se para um prédio no “Caminho do Reservatório”. O prédio se localizava na margem direita do Rio Santo Antônio, início do Bairro Ypú, mais ou menos onde se localiza a igreja São Bento. Os industriais Julis Arp e Maximilian Falck, bem como Augusta Emília Haasis, se quotizaram para a construção dessa nova sede. Como forma de sociabilidade executavam encenações teatrais com situações da cultura alemã, danças e cânticos folclóricos alemães, bandinhas, enfim, tudo que remetesse à memória da terra natal era celebrado nessa sede. Os alemães promoviam excursões de caminhada, convescotes e passeios a cavalo a Mury, fazenda do Cônego, Lumiar, estendendo a Banquete e a cascata do Conde d´Eu, em Sumidouro. Seguiam de trem a Bom Jardim, Carmo e Cantagalo. A ida a esses municípios não era ao acaso. Havia nessas localidades descendentes de colonos alemães que migraram para essas regiões em princípio do século 19. No tocante ao suporte espiritual, não havia nessa ocasião, como atualmente, um pastor luterano domiciliado em Nova Friburgo. Suas visitas eram a cada três meses permanecendo pouco tempo no município.
Nova Friburgo era uma cidade veranista quando empresários alemães aqui chegaram em 1911. Décadas antes, em 1824, um grupo de colonos de diversos Estados alemães havia se instalado nesse município. Peter Julius Ferdinand Arp inicia a instalação de indústrias no ramo têxtil em Nova Friburgo, juntamente com outros empresários alemães. Desde que implantadas essas indústrias, inúmeros técnicos alemães são cooptados para trabalhar nas fábricas e fixam domicílio em Nova Friburgo. Durante a Primeira Guerra Mundial navios alemães da Marinha Mercante alemã são apreendidos e uma das cidades a que se destinou esses marinheiros foi Nova Friburgo. Com tantos alemães em Nova Friburgo, criaram uma associação utilizando inicialmente um prédio próprio no centro da cidade. Como o número de associados crescia cada vez mais sentiu-se a necessidade de ampliação desse espaço. Em 26 de maio de 1935 foi lançada a pedra fundamental do edifício da nova sede da Sociedade Alemã de Escola e Culto, onde hoje está situada a Sociedade Esportiva Friburguense. A aquisição do terreno e início da construção contou novamente com o apoio de Julis Arp e de Maximilian Falck. Um prédio seria destinado para a escola e outro para a sede social. Esses empresários auxiliaram através de suas empresas, emprestando dinheiro para aquisição do terreno e construção da sede, com uma garantia hipotecária. Sem o auxílio desses empresários a escola teria permanecido em instalações modestas. Os imigrantes italianos fizeram o mesmo, tendo criado uma escola para a formação de seus filhos que servia igualmente como espaço de sociabilidade para seus conterrâneos. O prédio funcionava na avenida, onde atualmente é o Edifício Itália, a poucos metros da sede dos alemães.
Com a idealização da nova sede na avenida, a sociedade até então fechada aos alemães, abre suas portas para seletos cidadãos friburguenses. No discurso de Frederico Witte, presidente da Sociedade Alemã de Escola e Culto, por ocasião do lançado da pedra fundamental da nova sede, declarou que “manifesta o desejo de ver ingressados em sua sociedade um número maior de nacionais para em um convívio mais íntimo ainda, os laços de amizade que nos unem”. Essa abertura aos friburguenses seria fundamental para a preservação desse patrimônio, nos anos seguintes, em virtude da perseguição sofrida pelos alemães. Quando do lançamento da pedra fundamental, estávamos há quatro anos antes da Segunda Guerra Mundial. O nazismo lançara suas bases políticas na Alemanha e o fascismo na Itália. No Brasil, os adeptos da ideologia nazifascista se organizaram através do partido integralista. Nova Friburgo possuía muitos adeptos do fascismo entre os imigrantes italianos e igualmente do integralismo, mormente entre os profissionais liberais. Não é por acaso que localizamos sobrenomes como Mastrângelo e Bizzoto comparecendo às reuniões de preito a Adolf Hitler. Os italianos igualmente formaram o Partido Fascista em Nova Friburgo. Um importante porta-voz do Partido Integralista foi o professor Júlio Ferreira Caboclo. Logo, os alemães se sentiram muito à vontade para se manifestar a favor do Partido Nacional Socialista. Na cerimônia de lançamento da pedra fundamental do edifício da sede da Sociedade Alemã de Escola e Culto foi hasteada a bandeira nazista, com a suástica, e cantado o hino do Partido Nacional Socialista. Parte dos discursos era em alemão que a imprensa de forma aduladora chamava de língua de Göthe. Contou com a presença do prefeito, de membros do partido integralista, do diretor do Sanatório Naval e de todos os representantes das associações de imigrantes. Nos discursos, segundo o livro de Luiz Henrique da Silva, “Um mundo na sociedade”, foi exaltado publicamente os valores do regime nazista. O jornal O Friburguense, de 02 de julho de 1935, na matéria “Lançamento das pedras fundamentais dos edifícios da sociedade alemã”, descreveu que no pavilhão brasileiro tremulava em alto mastro, ladeado pela bandeira alemã, a “de Hitler”.
No 46° aniversário de Hitler houve uma grande celebração na Sociedade Alemã de Escola e Culto. O jornal O Friburguense de 28 de abril de 1935, reportou as comemorações. Na ocasião era presidente da sociedade Frederico Witte. Discursos em alemão eram entremeados com os de língua portuguesa. O hino brasileiro antecedeu ao hino nacional alemão e ao do Partido Nacional Socialista. Richard Hugo Otto Ihns, o poderoso executivo da fábrica de Rendas Arp compareceu à essa solenidade, sendo esse parte de seu discurso: “...Quis a diretoria da Deutscher Schul und Kirchenverein confiar-me a difícil, porém, para mim muito grata incumbência de transmitir ao seleto auditório, principalmente aos brasileiros, os nossos agradecimentos pela benevolência que teve em aquiescer as justas e dignas homenagens que a Sociedade Alemã presta, neste momento, ao chefe de Estado e Chanceler da Alemanha, Adolf Hitler, cujo aniversário natalício festejamos hoje, quem tem nas suas mãos as rédeas do governo alemão, (...) notícias vindas dos nossos parentes na Alemanha nos cientificaram com mais detalhes e fidelidade a grande remodelação, o grande reerguimento, a grande ressurreição que o povo alemão deve a ação destemida, resoluta e incansável do Sociedade Alemã de Escola e Culto. Desse homem assombroso que conseguiu conduzir o povo alemão para uma vida melhor, dando bem estar a milhões de almas e implantando nelas a inabalável confiança no futuro melhor! A ele, o povo alemão deve a gratidão por ter dado trabalho a milhões de compatriotas que, desocupados, tinham perdido a esperança para uma vida melhor. As milhões de crianças que viviam num ambiente triste e cheio de desconfianças, trouxe ele o conforto de um horizonte claro para o seu desenvolvimento...” Júlio Ferreira Caboclo, usando da palavra fez uma exaltação das qualidades de Adolf Hitler e da Alemanha. Seus discursos publicados no jornal O Friburguense eram sempre de preito a raça pura, mormente a ariana. Outro discurso interessante foi o de J. Nunes da Rocha, representado a Associação Comercial e a Liga dos Proprietários. Homenageando Hitler, chamou-o de alma da raça germânica e coloca os alemães como os responsáveis pela transformação de Nova Friburgo, passando-a de modesta cidade de veraneio para um centro industrial de relevo. Ainda segundo ele, as indústrias alemãs deram origem a outros menores, fomentaram o comércio, aumentaram as rendas do município e atribui todo o progresso do município ao made in Germany. Rocha destacou ainda: “Digamos todos que há muita razão para que todos benqueiramos, em Friburgo, aos alemães que aqui vão se fixando...” O diretor do Sanatório Naval, Dr. Oswaldo Palhares, igualmente prestigiou a comemoração do aniversário de Adolf Hitler. Talvez o leitor a essa altura esteja interpretando a posição política desses indivíduos como que apoiando os campos de concentração e extermínio de comunistas, ciganos, homossexuais e judeus, fruto da política de limpeza étnica do nacional socialismo. Mas não corresponde a realidade! Ainda estávamos no período do “ovo da serpente” e se desconhecia as atrocidades que seriam praticadas pelo regime nazista. Tampouco os próprios cidadãos alemães sabiam do que ocorria. Todos os alemães que imigraram para Nova Friburgo fugiam da fome, da miséria e do desemprego da Alemanha após a Primeira Guerra Mundial. Viam Adolf Hitler promover o progresso do país, construir estradas ligando toda a Alemanha recém-unificada, gerar empregos, enfim, dar auto estima ao povo germano. Não devemos cometer anacronismo e interpretar as pessoas que celebraram o aniversário de Hitler em Nova Friburgo sob a luz do conhecimento que temos hoje do que se passou naquele período. Na realidade, os verdadeiros arautos e líderes do Partido Nazista em Nova Friburgo eram Max Cleff e Oscar Schultz, nos informa Richard Ihns, filho de Richard Hugo Otto Ihns. Os alemães em Nova Friburgo pagariam caro, mais adiante, por essa posição partidária em favor do nacional socialismo.
Nem todos os alemães estavam de acordo com o rumo político tomado pela Sociedade Alemã de Escola e Culto. Fora criada para manter as tradições do povo alemão, educar as novas gerações, ser um espaço de sociabilidade e de práticas esportivas. Tomara um caminho político que desagradou a alguns provocando a cisão da comunidade alemã. Alguns alemães tinham em suas residências uniformes, bandeiras, enfim toda uma parafernália do partido nazista e pareciam estar prontos a servir ao führer a qualquer ordem vinda da Alemanha, foi o que percebeu o historiador Luiz Henrique da Silva ao entrevistar um ex-membro desse partido anos atrás. Em razão do alto nível de tensão os que eram partidários de um posicionamento político saíram da sociedade civil e criaram o Lar Alemão. Funcionava na Rua Augusto Spinelli, em um prédio histórico que existe até hoje, onde funciona o atendimento do Hospital Maternidade. Apesar da dissidência, o novo prédio onde se instalaria a Sociedade Alemã de Escola e Culto foi concluído graças às gestões do engenheiro Hans Gaiser, proprietário da metalúrgica Ferragens Haga, de Richard Ihns e do aporte de capital das indústrias alemãs.
A comunidade alemã de Nova Friburgo somente voltaria a ser um grupo coeso a partir da vinda do pastor luterano Johannes Eduard Schlupp, no ano de 1937, que veio justamente para resolver o cisma dessa comunidade. Schlupp conseguiu a união de ambas as facções e seu sucesso foi tal que terminou por se estabelecer definitivamente em Nova Friburgo à frente da igreja Luterana. Com a transferência para a nova sede na avenida da Sociedade Alemã de Escola e Culto a prática esportiva ganha relevo. Introduzem em Nova Friburgo o faustball(punhobol) e o bolão, semelhante ao boliche. Nesse momento passam admitir não alemães ao seleto clube, mormente os integralistas, o que seria providencial no futuro. No entanto, com o advento da Segunda Guerra Mundial a situação dos alemães e italianos em Nova Friburgo fica delicada. O Brasil toma uma posição política contra a Alemanha nazista e a Itália fascista. Inicia-se a perseguição aos imigrantes alemães e italianos em Nova Friburgo. O prédio da Escola Italiana, um dos mais lindos de Nova Friburgo é confiscado pelo governo federal e transformado em delegacia de polícia. Temendo a extradição, toda a documentação desse período foi destruída pelos italianos. Com essa atitude perdemos todas as fontes sobre a organização do Partido Fascista em Nova Friburgo. Mas italianos tiveram uma vantagem sobre os alemães. Contaram com o apoio da liderança política de Dante Laginestra, italiano, que conseguiu depois de passado o período de caça às bruxas que o prédio da escola retornasse a comunidade italiana. Em 1938, a Sociedade Alemã de Escola e Culto percebendo um clima de animosidade mudou o nome dessa instituição para Sociedade Teuto-Brasileira. Anos depois, em 1941, muda novamente a denominação para “Sociedade Alemã de 1921”. Mas nada disso adiantaria. Aquele clima de preito e louvor que antes era tecido aos industriais e industriosos alemães, que tantos empregos diretos e indiretos geravam no município, vira repentinamente. Vários membros da Sociedade Alemã de Escola e Culto foram presos e levados para o Presídio da Alameda São Boaventura, em Niterói. Alguns ficaram detidos por vários meses. A população local hostilizou os alemães que foram proibidos de falar o seu idioma. A sociedade musical de Lumiar, composta em sua maior parte por alemães, teve os seus instrumentos musicais queimados. Até mesmo a Praça Paissandu que levava o nome do poderoso industrial Julius Arp foi retirado. Os membros friburguenses que faziam parte da outrora Sociedade Alemã de Escola e Culto evitaram o confisco de seu patrimônio pelo governo federal. Foi vantajosa a introdução desses membros não alemães a essa instituição. Por conseguinte, o antigo espaço de sociabilidade alemão passou a ser designado de Sociedade Esportiva Friburguense, nome que mantém até hoje. A história da presença de imigrantes alemães em Nova Friburgo é muito instigante quando nos debruçamos sobre alguns fatos, que somados, tem um desdobramento de grande importância na história local. Os imigrantes alemães mudaram a história de Nova Friburgo. Foram os responsáveis pela industrialização da pacata cidade veranista colocando Nova Friburgo como uma das cidades mais exponenciais do estado na primeira metade do século 20. Todos esses artigos são baseados no livro de Luiz Henrique da Silva “Um mundo na sociedade”.
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