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Foto do escritorJanaína Botelho

LILITO, O CARISMÁTICO COMUNISTA



Manoel Pereira Leite, o Lilito, era filho dos imigrantes portugueses Domingos José Leite e Filomena Pereira Leite que vieram de Trás dos Montes e se estabeleceram em Nova Friburgo. Nascido em 03 de dezembro de 1908, tinha quatorze anos quando o Partido Comunista surgiu no Brasil e vinte e um anos quando em 1929, passa a existir em Nova Friburgo. O que dizer de Lilito, o carismático comunista da cidade serrana? Tarcísio Tupinambá escreveu na crônica Avental Manchado, publicado no jornal A Gazeta de Nova Friburgo, em 16 de julho de 1983, que Lilito não só vendia carne no açougue, mas também costumava doutrinar os seus fregueses com suas convicções políticas. E seus fregueses o ouviam com atenção e respeito. Segundo ele, “Lilito era uma espécie de oráculo, um hermeneuta, um intérprete dos fenômenos políticos, econômicos e sociais que iam do mundo ao município. E não se diga que fosse um homem de grandes estudos na escola.


Todavia seu raciocínio e suas conclusões eram perfeitas, lógicas, espontâneas e claras.” As palavras ética e moral estavam sempre presentes em seus discursos. No açougue, enquanto os fregueses o aguardavam no corte da carne brandindo um enorme facão, de forma astuta, Lilito usava o tempo de espera para fazer proselitismo e seduzi-los na doutrina de Karl Marx. Quando alguém o contestava e saía uma discussão, no ardor da polêmica, Lilito sempre contemporizava e tudo terminava em um simbólico aperto de mão, já que estas estavam sempre sujas de sangue impedindo um contato real. Mesmo pregando o comunismo em uma sociedade conservadora como Nova Friburgo, nunca fez um inimigo e nem perdeu a freguesia. Na sua fala mansa e rouca, devido ao cigarro que consumia a sua saúde, a pregação não maculava o seu carisma pois terminava se justificando que apenas desejava um mundo melhor. O cineasta Roberto Faria declarou em uma entrevista sobre o “queridíssimo tio Lilito, velho comunista que me abriu os olhos para o mundo da política”. O Partido Comunista foi proibido pelo governo Vargas e no período de ditadura militar. O fato de Nova Friburgo possuir um complexo industrial com inúmeras fábricas provocava nas autoridades uma eterna vigilância.


Quem fazia o papel de polícia política no município era o Sanatório Naval, que prendia e interrogava os militantes do partido proscrito. Quando o comando da política militar iria se instalar na região serrana optou-se por Petrópolis como sede do batalhão. No entanto, numa reunião, alguém levantou a mão e disse que Nova Friburgo era um município com muitos comunistas e que os operários das fábricas eram um verdadeiro combustível para as suas articulações. Esse argumento prevaleceu e Nova Friburgo teve a primazia da sede do comando da polícia militar entre os municípios da região serrana. Quem lê sobre o cotidiano do carismático açougueiro Lilito não imagina o nível de tensão que havia em Nova Friburgo entre os sindicalistas da classe operária e a direção das indústrias têxteis e metalúrgicas. Conforme pesquisa do historiador Ricardo da Gama Rosa Costa, uma mobilização operária deu origem a uma greve, em janeiro de 1933, iniciada na Fábrica de Rendas Arp e propagando-se para as outras indústrias.


A repressão policial desencadeada sobre as manifestações dos operários em greve redundou na morte de Licínio Teixeira. Já em 1946, uma nova greve envolveu os operários das indústrias Rendas Arp, Ypu e Filó. O Partido Comunista tinha força já que Francisco Bravo chegou a ser eleito vereador em 1962, tendo sido cassado pelo regime de ditadura militar. Se destacaram igualmente como militantes do Partido Comunista, através dos sindicatos, Costinha e Arquimedes de Brito. Ainda segundo Ricardo Costa, outra greve ocorreu em 1986, paralisando a Fábrica de Rendas Arp. Na década seguinte, os operários ocuparam as indústrias metalúrgicas Haga e Eletromecânica. Logo, nos parece que o comunismo em Nova Friburgo não era mera utopia e discurso de pé de ouvido como fazia o açougueiro Lilito com os seus fregueses. Falecido em 31 de julho de 1991, foi com a sua retórica que Lilito abriu os olhos do cineasta Roberto Faria sobre política. E em relação a mim igualmente. Foi através de inúmeras conversas com o Seu Lilito, como eu o chamava, que me convenci no período em que fazia o curso de direito, que o comunismo era a solução para um mundo melhor.



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